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Luxo e sustentabilidade

Olhando para o passado. E nem precisa ser da sociedade, basta nossa vivência pessoal. Nascidos antes de 1980 sabem que objetos, roupas e mesmo eletrodomésticos duravam mais. Eu me lembro dos móveis na casa de meus pais, alguns hoje comigo, com mais de 100 anos. Arcas, cadeiras, cristaleiras feitas com madeiras nobres maciças. O aparelho telefônico, com fio, parecia novo mesmo depois de anos de uso. Para frustração minha, que fui sempre novidadeiro, a mochila da escola, sempre bem-feita, durava anos, assim como estojos, trazidos das viagens do meu pai para o Japão.

Nem preciso dizer o que acontece hoje. Tudo é substituído após meses. E nem é por vontade do consumidor já que não existe mais o “estar na moda” impondo uma dinâmica aos armários. É por estratégia das empresas, que a pretexto de democratizar o acesso aos bens, baratearam os produtos e consequentemente o ciclo de vida de celulares a móveis, inclusive para se vender mais. O conceito de modernidade líquida de Bauman é muito complexo, mas se aplica a consumos. Tudo pode ser facilmente descartado, de reputação a bens materiais, sem esquecer dos relacionamentos.

Ora, um dos maiores atributos do luxo, desde sempre foi a excelência. A perfeição no fazer. A precisão do artesão que é sobretudo um artista. Nas grandes casas francesas como Chanel, Hermès, Vuitton, Van Cleef, os produtos precisam durar décadas, passando por gerações. Uma característica do luxo que ele pode ser reparado. Não por defeito, mas por uso. O descartável é o avesso do luxo. Senão, pense em tomar um café em um copo de plástico ou em uma xícara de porcelana. Luxo é a busca pela perfeição. E o perfeito não precisa ser refeito. Ele nasce para ser eterno.

Por essa razão, luxo nunca será fast. Fast fashion, fast food. Luxo precisa ter paixão, gerar vínculos e experiências profundas, não só para quem consome, mas para quem produz. Luxo envolve investimento e tempo. Por isso é caro. Um vestido Chanel de alta costura emprega mais de 200 horas de trabalho e no mínimo 10 empregos diretos e indiretos. Você nunca verá uma costureira dos ateliês parisienses trabalhando em condições análogas às de escravidão, como na Ásia. Não se vê reclamando de condições de trabalho como em algumas oficinas do Bom Retiro.  Na França, em 2022 há 10 mil vagas não ocupadas, das quais 50% delas são na área de produção.

O luxo exige profissionais bem treinados e investimento em cultura e arte. Não há luxo se não existe artesanalidade. Luxo valoriza saberes ancestrais, autenticidade e produtos orgânicos, naturais. Daí que luxo é sustentável sim. Principalmente para os novos criadores que aboliram o uso de peles animais, olham com aversão o foie gras e procuram incorporar conceitos de circularidade, cruelty free e comércio justo em suas produções.

Quem consome o verdadeiro luxo pensa mais em experiência no que na posse. Mais na qualidade que na quantidade. Diante de um mundo cada vez mais dominado por máquinas, a valorização do luxo significa mais emprego. Em um mundo que celebra a diversidade, o mercado de alto padrão defende as diferentes culturas. E é nisso que acreditamos: no pequeno produtor de orgânico, na costureira ou alfaiate que faz uma roupa exclusiva que vai durar décadas, na bordadeira do Nordeste brasileiro que faz uma toalha única, no artesão indígena legítimo que confecciona uma semi joia com seus saberes antigo, na comida feita por um chef com produtos frescos da estação.

O luxo trabalha com todos os sentidos. E com sentimentos.

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Les Cinq Sens.

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