Arte & Cultura

A unicidade do feito à mão

Trabalho artesanal é tendência global e tem rendas e bordados regionais como estrelas de mostra, no museu A CASA, em São Paulo

De tempos em tempos, eu tenho por hábito incluir nas minhas pesquisas a busca pelo significado de algumas palavras, termos, gírias… Enfim! Uma brincadeira que me estimula quanto ao traquejo na comunicação. Eis que me deparo com a palavra “artesanal” sendo descrita como “aquilo que é feito sem sofisticação; rústico…”. Foi um espanto total, visto que o termo é justamente o oposto e se aplica àquilo que é produzido de maneira única, feito à mão, sob medida…

Embora trate-se do ofício, verdadeiramente, mais antigo da história de todos os povos, no Brasil, o artesanato ainda não recebe todo o reconhecimento que lhe é devido. É claro que isso envolve questões históricas, culturais e passa por diferentes meandros da educação, mas, o fato é que, desde as primeiras civilizações, o trabalho manual é parte da realidade humana. Com o tempo, mudaram-se os nomes, segmentaram-se as habilidades e mesmo a figura do artesão foi estereotipada em certas regiões. Mas o trabalho manual segue firme, forte e, nesta fase pandêmica, está ainda mais reconhecido e respeitado.

Segundo apontamentos da WGSN, autoridade global em previsão de tendências de consumo, a tecnologia e o metaverso serão fortemente explorados neste e nos próximos anos, assim como a sustentabilidade, as preocupações com o meio ambiente e o chamado Luxo Doméstico, ou seja, quando consumidores passam a substituir as compras em grandes marcas globais de luxo por etiquetas locais e, isso, inclui o artesanato, ou seja, o produto produzido de modo que se possa contribuir com a economia local, assim como que permita a sua rastreabilidade, que se saiba como, por quem e de que maneira as peças são criadas, conhecendo-se o seu caminho até chegar a quem a consome.

Não bastasse as máscaras de tecido terem feito crescer a visibilidade do setor para o grande público, o mercado que já movimentava mais de R$ 50 bilhões ao ano – segundo dados do SEBRAE –, sempre foi forte na moda e na decoração, haja vista as bolsas icônicas, os sapatos e mesmo a presença das técnicas artesanais nas semanas de moda, sem contar o mobiliário único, criado e esculpido por grandes nomes da arquitetura.

Ponto alto da valorização do trabalho artesanal, está na exposição “Um olhar sobre o acervo – rendas e bordados”, a primeira mostra de 2022 do A CASA – Museu do Objeto Brasileiro, que teve início em 22 de janeiro e fica aberta até 20 de março desse ano.

São bordados e rendas de diferentes localidades, explorando técnicas variadas e apresentando muito da cultura brasileira por meio de suas tramas. A seleção das peças e a montagem da exposição foram realizadas pelo designer de interiores Julio Rosa e pela jornalista Zizi Carderari. Além de bordados, a mostra apresenta rendas vindas de locais muito específicos do país, como a irlandesa de Divina Pastora, em Sergipe, a filé e a labirinto, do Ceará, e a de bilro de Morros de Mariana, no Piauí. Mais que isso, segundo Renata Mellão, fundadora do museu, “todas elas, revelam ao público as riquezas de um pujante Brasil”.

Passear pela mostra permite, além das técnicas tradicionais, conhecer e explorar trabalhos contemporâneos, como os assinados por estilistas em parceria com associações de artesãs. São cinco vestidos confeccionados por Dudu Bertolini, Lino Villaventura, Adriana Barra, Amapô e André Lima, que vieram da exposição ‘Renda-se’ (2015), com curadoria do próprio Bertolini. Há, também, no espaço, a escultura de bambu com 5,90 m de altura, criada pelo engenheiro Dom Fernandes, da Bronkz Bambu, inspirada na obra do arquiteto vietnamita Vo Trong Nghia, que remete a uma árvore. Na versão idealizada para o museu, ela ganhou um banco que circunda a estrutura. Lembrando que a obra do vietnamita foi exibida pela primeira vez na CasaCor São Paulo 2021, no ambiente de Kalil Ferre Paisagismo.

Vale a pena visitar a mostra e conhecer, pelo manos, parte da nossa cultura artesanal, não apenas para entender a força do artesanato como potência econômica, mas como tendência mercadológica e que, há tempos, chegou para ficar.

Serviço

Um olhar sobre o acervo: rendas e bordados

Período de exposição: 23 de janeiro a 20 de março de 2022

Visitação: de terça a domingo, das 10h às 18h30 – Entrada Gratuita

Onde: Avenida Pedroso de Morais, 1216 | Pinheiros | São Paulo

Informações: https://acasa.org.br/  (11) 3814-9711 / 3097-8840

Foto: acervo @museuacasa, via Instagram

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Les Cinq Sens.

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