Mercado

Há que se pensar a comunicação como uma extensão de sua forma de se relacionar e sentir

Há que se pensar a comunicação como uma extensão de sua forma de se relacionar e sentir

Cabe muita coisa debaixo do guarda-chuva de quem quer transmitir uma mensagem. Neste meu primeiro texto não vou me aprofundar na comunicação, nas estratégias, mas quero começar pela proposta desse portal Les Cinq Sens, afinal trata-se dos cinco sentidos. Não seriam eles o primeiro passo para a comunicação? Ferramentas para a nossa sobrevivência, inclusive? Os cinco sentidos humanos, responsáveis pela captação de informações do meio em que vivemos, são a visão, a audição, o paladar, o olfato e o tato. Imagens, sons, sabores, aromas, toques e texturas que provocam estímulo e aguçam a percepção.

Veja os efeitos da pandemia nesses cinco sentidos da comunicação.  O tato, por exemplo, nesse período de Covid-19, nos mostrou a importância de um abraço, um aperto de mão, um cafuné. Percebemos o quanto demonstramos afeto por esse sentido. Saudosos de abraços nas partidas de um aeroporto, de uma rodoviária, de um hotel. Muitos ainda sentem as sequelas da falta de paladar e olfato, dois sentidos que nos transportam para experiências gustativas e até mesmo recuperam memórias afetivas de infância ou de alguma viagem.  Paladar que nos permite perceber os sabores e, sem dúvida, dá sentido à vida de quem gosta de desfrutar de uma boa mesa ou, simplesmente, de um pé de fruta.

Nesse último período de dois anos muita gente se perdeu, muitos se encontraram, algumas pessoas se refizeram, outras deprimiram. Nosso espaço transformou-se em um casulo de isolamento ou de criação. Algumas pessoas, por meio de sua atuação, levantaram outras pessoas consigo. As lives tiveram papel fundamental, mas hoje já temos medo da “terceira onda de lives”. Se pensarmos bem, existe uma certa obsessão em querer comunicar, influenciar, engajar de forma profissional, e, por vezes, sinto falta daquele conteúdo espontâneo que ouvi na conversa da mesa do boteco ao lado ou numa viagem de metrô. Aquele acontecimento que você não registrou, não gravou, não fotografou. Foi uma simples testemunha de um ato avulso que tocou e puxou consigo memórias de outras perspectivas de mundo.

Se, de um lado, temos um volume de conteúdo sendo comunicado diariamente e instantaneamente, quase em tempo real, verificamos que já vinha avançando um comportamento de certa introspecção social, de um desejo genuíno de ter experiências agregadoras e menos ostensivas.

O pensador Ailton Krenak em seu livro “Ideias para adiar o fim do mundo”, publicado pela Companhia das Letras, traz um contraponto muito interessante sobre a sociedade contemporânea “Nosso tempo é especialista em criar ausências: do sentido de viver sociedade, do próprio sentido da experiência da vida…

E continua: “… Minha provocação sobre adiar o fim do mundo é exatamente sempre poder contar mais uma história”.

Uma vez que a arte é, basicamente, transgressões e ressignificações de tema/objeto, forma, conteúdo e sensações, traduzir esses significados em narrativas é uma jornada mais do que criativa. É uma postura de muita responsabilidade que demanda estar atento e ter um certo repertório, passando por uma transformação em que nossa construção na área da comunicação e, por conseqüência, na nossa existência, terão que se dar de outra maneira. Esses pacotes de ideias de verdades bem embaladas e oportunistas que alimentamos em grande estilo têm prazo de validade.  Então, que a gente pare de despistar os nossos instintos e não nos deixemos levar pelas narrativas ilusórias, confortáveis e repetitivas, pois a arte, assim como a comunicação, é uma necessidade de expressão com grande função social, tão antiga quanto a própria humanidade.

* Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Les Cinq Sens.

You may also like